31 milhões de empregos ameaçados

31 milhões de empregos ameaçados — e o maior risco ainda é a omissão educacional

A inteligência artificial generativa já deixou de ser uma tendência tecnológica — é agora um vetor real de transformação econômica. E no Brasil, essa transformação tem números assustadores: 31,3 milhões de empregos podem ser impactados nos próximos anos, segundo estudo recente da LCA 4Intelligence, com base na metodologia da OIT.

Mas enquanto o mundo do trabalho se reconstrói diante dos algoritmos, a escola permanece no mesmo lugar, repetindo fórmulas, ignorando sinais e preparando os jovens para um mercado que já não existe.

Os dados são claros. Mas ainda não estamos escutando

A exposição ocupacional à IA generativa não é mais um exercício de futurologia. Ela já está em curso.

  • Mais de 30% da força de trabalho brasileira está em áreas diretamente impactadas pela automação inteligente;

  • 5,5 milhões de empregos estão sob risco alto de substituição completa;

  • Funções administrativas, de escritório e processamento de informações são as mais vulneráveis.

Essas ocupações sempre foram a porta de entrada para milhões de jovens e trabalhadores de classe média e baixa escolarização. Agora, estão sendo automatizadas por sistemas que não dormem, não erram e não cobram salário.

O primeiro impacto da IA não será sobre a elite qualificada — será sobre quem fazia o "meio de campo" das organizações.

IA não é só risco — é uma bifurcação

A inteligência artificial também pode ser um motor de crescimento, criatividade e liberdade produtiva. Ela pode automatizar tarefas repetitivas e liberar tempo para aquilo que exige julgamento, empatia, visão sistêmica. Mas isso só acontecerá se as pessoas forem preparadas para assumir esse novo lugar.

E hoje, não estamos fazendo isso.

Um relatório conjunto da ONU e da OIT mostrou que a IA afeta mais fortemente:

  • mulheres,

  • trabalhadores qualificados em funções administrativas,

  • profissionais de países com alto acesso digital e baixa diversificação funcional.

Ou seja: os mais expostos à IA não são os menos qualificados — são aqueles que executam funções cognitivas rotineiras, mas ainda pouco criativas. E isso exige, mais do que nunca, uma educação que vá além da técnica.

A escola brasileira ainda está no século XX

Apesar dos sinais, o currículo escolar continua focado em:

  • transmissão de conteúdo fragmentado;

  • avaliações com gabarito único;

  • preparo para vestibulares que ignoram criatividade, ética ou colaboração;

  • ausência quase total de temas como IA, pensamento computacional, algoritmos ou ética digital.

Estamos ensinando a competir com a IA — quando deveríamos estar ensinando a colaborar criticamente com ela.

A verdadeira proteção contra a obsolescência profissional não virá de leis trabalhistas, mas da formação integral do sujeito.

Quem sabe pensar, improvisar, criar e julgar nunca será substituído.
Quem apenas executa ordens será cada vez mais comparado — e superado — por sistemas generativos.

Para reflexão:

“O emprego que a IA vai eliminar não é o do trabalhador. É o do pensamento raso.”
“O maior risco não é a IA tirar seu trabalho. É você nunca ter sido preparado para fazer algo que a IA não pode fazer.”
“A inteligência artificial exige inteligência humana. E é isso que está faltando nas nossas escolas.”

O que fazer, agora?

  1. Inserir IA no currículo escolar de forma transversal: ética, regulação, linguagem de IA, pensamento crítico sobre algoritmos, uso criativo.

  2. Formar educadores como mediadores entre a cultura digital e a cultura humanista: não basta usar tecnologia — é preciso saber o que ela significa.

  3. Criar projetos interdisciplinares com IA generativa: estimular alunos a explorar, criar, testar, errar e aprender com — e apesar — das máquinas.

  4. Desenvolver competências intransferíveis à IA: como empatia, julgamento moral, intuição, imaginação, design de soluções e leitura de mundo.

  5. Estabelecer políticas públicas que conectem escola, mercado e inovação social, criando um ecossistema real de aprendizagem contínua e requalificação.

Conclusão

A discussão sobre IA e trabalho no Brasil já começou — mas ainda está limitada ao setor produtivo e aos centros de poder.
Enquanto isso, o chão da escola segue intacto, como se ensinar a decorar datas e fórmulas fosse suficiente para enfrentar um mundo onde até a redação do Enem pode ser feita por um robô.

A inteligência artificial pode transformar o mundo do trabalho.
Mas quem vai transformar o mundo da educação?

Se não começarmos essa virada agora, continuaremos formando milhões de jovens para empregos que já não existem — e deixando o futuro nas mãos de quem programar melhor os algoritmos, e não de quem souber pensar para além deles.

Marcos Breder, Ph.D.
Educador, pesquisador e mentor de futuros possíveis. Atua há mais de 20 anos com jovens no ensino médio, graduação e pós-graduação, com foco em design, comportamento e inovação educacional na era da inteligência artificial.

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/06/03/ia-generativa-pode-afetar-313-milhoes-de-empregos-no-brasil.ghtml https://brasil.un.org/pt-br/294688-ia-generativa-e-empregos-um-índice-global-refinado-de-exposição-ocupacional